Textos para Carlos Nogueira
por ÁLVARO SIZA
Sou dos que persistem em encontrar nos territórios da Arquitectura e das (outras) Artes – nomeadamente a Escultura, mas também a Pintura ou a Música – uma relação original indestrutível.
O processo de depuração que acompanha o aparecimento da «Arquitectura Moderna» e a exasperada pesquisa individual e colectiva, no interior dos percursos de uma explosiva transformação, foram progressivamente corroendo aquele relacionamento, dissociando-as.
Paradoxalmente ou não, diluem-se contudo, ou rompem-se, as fronteiras de definição tradicional das práticas e expressões artísticas – sem que isso signifique o retorno a uma comunhão referida à «Mãe de todas as Artes». Uma espécie de caldo de cultura, em paralelo a outras vertentes de procura ou de conhecimento.
A escultura contemporânea (se nos quisermos referir a uma delimitação tradicional) compreende a leitura transformadora da Natureza de Chilida, as figuras de Moore, demarcadas da Natureza de que dependem, em distante mas perceptível diálogo, ou as «ocupações temporárias» de Christo, depois das quais nada será como antes.
É nestas áreas que se movem os gestos de Carlos Nogueira: formas autónomas relacionadas entre si e com a paisagem – o que há de comum à Arquitectura e à Escultura, ou próximo, deslizante, no interstício do que as distingue.
Sou igualmente dos que pensam qua a cidade, ou o território, não necessitam, em princípio, do aceno de «obras de Arte». Uma cidade de espaços conformados – negativo dos gestos de existência – é, exclusivamente por isso, bela. Impregnada dessa vida, revela-se excitante e misteriosa e tranquila – conforme cada um de nós o desejar.
Mas é um facto que as cidades portuguesas, ou o seu território, se transformam – agora – alheias a esse «fazer parte». O trabalho de Carlos Nogueira enraíza na resistência a um alheamento que inclui a tantas vezes gritante demissão de arquitectos e planeadores.
Outubro 1994
In Carlos Nogueira, permanência da água, Lisboa, Dezembro 1994, p. 32-33.