.Carlos Nogueira
por JORGE MOLDER
Numa primeira aproximação, é inevitável associar o trabalho de Carlos Nogueira a uma ideia imediata de arquitectura: porque ocupa o espaço à maneira de um «edifício» e também porque os materiais que utiliza deixam suspeitar essa proximidade.
Em Janeiro de 1998, Carlos Nogueira mostrou na FCG, por ocasião da exposição retrospectiva do Arq.º Luís Cristino da Silva e por sugestão do seu comissário, o Arq.º José Manuel Fernandes, uma obra que constituía, de certo modo, uma abertura para esta exposição. Esta obra não estabelecia com as obras de Cristino da Silva qualquer relação formal evidente. A sua ligação era de ordem conceptual: o trabalho de revisitação que era a exposição e a escultura de Carlos Nogueira mostravam construções que deixavam transparecer as marcas dos seus fazeres.
Pode-se, aliás, pensar esta aludida aproximação partindo para ela de uma outra forma, socorrendo-nos para isso de um termo clássico, que lhe empresta uma pronta compreensão: arquê, princípio. De facto, à maneira de arquitectura, a obra deste artista plástico é um trabalho que tem a ver com princípios, princípios de organização e de entendimento do mundo, mas igualmente princípios no sentido elementar de apelo a realidades primeiras. Encontramo-los na sua organização, nos seus elementos constitutivos e, decisivamente, numa necessidade de sentido que o seu trabalho sempre revela.
Carlos Nogueira faz desenhos, esculturas, instalações, construções, obras em que a atribuição de um género se torna, até certo ponto, irrelevante: podendo-se reverter estas atribuições sem que o resultado se altere. Pode-se pensá-las todas como esculturas, como instalações ou talvez, melhor ainda, como desenhos. É certo serem ocupações do espaço e mostrarem-nos arquétipos da nossa relação com ele, num plano perceptivo e simbólico. O artista usa um vocabulário tipo, simultaneamente, simples e complexo: simples pela sua materialidade e complexo pelas múltiplas significações que desencadeia. Os materiais que usa levam-nos a repensar o que é para nós o peso e a leveza, a luz e a sua sombra, a transparência e a opacidade, o que não brilha e o que reflecte. O desenho articula-os em construções aparentemente simples, mas em que se encontra sempre mais um outro patamar em que se adivinha ainda um outro sentido.
Pode-se, igualmente, pensar as suas obras como elementos de uma mediação entre o eu e o cosmos, de alguma forma como «sítios» onde o microcosmo e o macrocosmo se reflectem, onde é possível captar o sentido desses movimentos ou momentos que constituem mundos. O interior e o exterior são mais um par de contrários que atravessa a obra deste artista.
O seu agir é discreto. Não cria obras que operem de forma dramática, tudo se passa de uma forma lenta que nos encontra e que vamos lentamente encontrando. Sentimos-lhe o tempo e sentimos o tempo em que as vamos cada vez mais encontrando. Movemo-nos nos caminhos que nos abrem, descobrindo-as e descobrindo também os nossos passos.
In Carlos Nogueira, a ver, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 2002, p. 21-25.